LIBERTAÇÃO
Libertação "de todos os
pecados" significa, para os evangélicos luteranos, que eles são livres do
seu passado, da sua consciência presa à eterna autodefesa. Somos livres no
nosso dia-a-dia para uma ação responsável, embora arriscada - uma ação que visa
defesa da vida humana. No exercício de nossa responsabilidade, não nos
atormentamos quando urge tomar decisões que envolvem conflitos em normas.
Insistimos em seguir a Jesus (Mc 2.23 - 3.6). E nos valemos do consolo de
Lutero: "Peca com coragem, mas crê e alegra-te tanto mais em Cristo."
Experimentamos que a solidariedade com os oprimidos e deprimidos não termina
onde se cai em culpa. Luta séria contra opressão dificilmente fica a salvo da
culpa. Jesus Cristo traz perdão para a pessoas que se tornam culpadas por
salvaguardar a outras.
Libertação "da morte"
significa, para os evangélicos luteranos, que eles mantêm a esperança mesmo no
desespero (Rm 4.18). Nós temos "a liberdade dos sem-esperança" (J.
Moltmann, teólogo protestante, contemporâneo respeitado) Não desanimamos com
seguidos fracassos. Enxergamos longe. Mostramos que os mecanismos da
preocupação e do medo deixam a pessoa passiva, induzindo-a a acomodar-se.
Desmascaramos a desarmarmos tais mecanismos e, em situação de risco, sabemos
que a morte jamais é o fim. Em conseqüência, a vida, seja ela como for, não é
tudo. Evangélicos luteranos o comprovam em sua existência. Estão conscientes de
que todos os movimentos de libertação começam quando um punhado de pessoas
perde o medo.
Libertação "do poder do diabo"
significa, para os evangélicos luteranos, que eles são livres dos seus
"instintos, inclinações e circunstâncias" (H. J. Iwand, teólogo
evangélico luterano já falecido, intérprete magistral de Lutero). Alegramo-nos
por sermos aceitos sem precisar demonstrar o nosso valor e a nossa produção.
Somos valiosos independentemente das nossas posses e dos nosso conhecimentos.
Por isso evangélicos luteranos já não se sentem constrangidos a fazer ídolos de
si mesmos. São autocríticos e, antes de desconfiarem dos outros, desconfiam de
si. Tiram primeiro o pedaço de madeira que está no seu olho e então vêem bem
para tirar o cisco que está no olho de outras pessoas (Mt. 7.5). Não se
preocupam com monumentos de si próprios pois sabem que glorificar-se da sua
obra é sinal de escravidão (Iwand).
SEM PROIBIÇÕES
Assumindo "a liberdade para a
qual Cristo nos libertou", tudo é nosso ( 1 Co 3.22). Tudo está à nossa
disposição. Nada nos mete medo. Não há proibições para nós.
Acontece, todavia, que existe mais
receio dessa liberdade do que alegria de vivê-la. Quem a experimenta de fato? A
maioria, também entre os evangélicos luteranos e as evangélicas luteranas,
prefere "se submeter de novo ao jugo da escravidão: (Gl 5.1). Gosta de
penas "debaixo dos elementos do mundo"(4.3), tais como temores e
ilusões, moda e opinião comum idéias fixas e superstições.
Tudo é nosso: fumo, bebida
alcoólica, dança, baralho, loteria, opção sexual. Na medida em que vivemos
"a liberdade para a qual Cristo nos libertou", mandamos embora regras
e tutores. Sabemos que tudo é nosso - mas atenção: nós somos de Cristo (1 Co
3:23). Quer dizer: temos liberdade de usar tudo, porém fazemos escolhas e não
nos tornamos dependentes. Aprendemos com cristãos e não-cristãos, mas
selecionando com critério, pois somos de Cristo.
Quando ficamos dependentes de algo
ou de alguém, voltamos "de novo ao jugo da escravidão". Se formos
incapazes de parar de beber, fumar, jogar devorar pratos preferidos, por
exemplo, a nossa dependência é patente. Poder abrir mão de qualquer dos hábitos
mencionados é a "prova dos nove". Se o conseguimos, somos livres. Do
contrário, somos escravos. Se não conseguimos articular e viver a fé sem
tutelamento de terceiros, viramos as suas criaturas e deixamos de ser criaturas
de Deus.
Seríamos superficiais se
detectássemos apenas uma eventual dependência nossa de certas pessoas ou dos
chamados "vícios". Descobrimos dependências mais perigosas do que
fumar ou apostar em jogos de azar, por serem encobertas e aparentemente não
prejudicarem a saúde e o convívio familiar. É o caso da dependência da posição
social, da família, da nossa cabeça dura, daquilo que se decorou, dos
preconceitos raciais, morais, políticos. Destas dependências pouca gente se
lembra. Não obstante, elas são arrasadoras para a vida e o relacionamento das
pessoas.
Está claro, pois, que dificilmente
há pessoa que não revele "vício" ou dependência. Vejamos quem está na
pior: quem não pode viver sem cigarro ou quem sempre teima em ter razão? Um
fumante inveterado ainda se agüenta. Mas quem nunca admite falha é chato
demais. E como saímos disso?
COMUNIDADE TERAPÊUTICA
"A liberdade para a qual
Cristo nos libertou" se recebe "onde dois ou três estão reunidos em
seu nome" (Mt 18.20) a comunidade.
Nesta ela é recuperada, defendida e
mantida. As dependências de toda sorte se combatem de maneira eficiente em
conjunto.
A comunidade é o lugar de terapia.
A terapia inicia com a pergunta: por que a pessoa é dependente? No processo de
cura, é preciso haver humildade, abertura, compreensão, confiança e esperança.
Em especial, a ida constante à refeição em que Cristo mesmo é "a comida e
a bebida, o cozinheiro e o jargão" (Lutero): a Ceia do Senhor. Ela é o
remédio que ataca o vício de toda espécie e liberta de todo tipo de
dependência.
Eis a convicção dos evangélicos
luteranos e das evangélicas luteranas vividos, calejados, cheios de
experiência.
SEM EGOÍSMO
"A liberdade para a qual
Cristo nos libertou" não nos larga à mercê do nosso bel-prazer. Deste
jeito, a usaríamos "por pretexto de malícia"(1 Pe 2.16). O nosso
egoísmo se apoderaria dela.
Somos livres, sim, exatamente da
"lei da nossa própria liberdade" (Moltmann). Motivo pelo qual escreve
Paulo: "Não sois de vós mesmos, mas de Cristo" (1 Co 6.19; 3.23). E
Lutero confessa: Jesus Cristo "me resgatou e salvou para que eu lhe
pertença e viva submisso a ele, em seu Reino, e o sirva em eterna justiça,
inocência e bem-aventurança".
Ser cristão resulta, para os
evangélicos luteranos e as evangélicas luteranas, em dar-se aos semelhantes
como Cristo se deu às pessoas. Lutero:"O cristão é um servo dedicado a
tudo, a todos sujeito." E de forma mais concreta: "Deve-se ler a
vontade de Deus nos olhos dos necessitados.
Aí colocamos os nosso pés na poeira
e metemos as nossas mãos no barro. Cerramos fileiras com aqueles que lutam por
pão e saúde, teto e terra, escola, vida partilhada, cidadania, organização
popular e transparente da sociedade. Nos solidarizamos com o povo cujo suor e
cuja consciência foram roubados. A nossa solidariedade com o próximo chegará ao
seu alvo quando o auxiliarmos a ser alcançado pela vida plena: Jesus Cristo
empregando-o no seu exército de libertação.
LIVRES LIBERTADOS, EM TUDO
Às vezes, Martim Lutero se chamou
"o livre libertado" e assinou assim documentos seus. Deste modo sintetizou
o ser-cristão todo. Nós, evangélicos luteranos e evangélicas luteranas,
aprendemos isso com ele. Oxalá todas as pessoas o aprendam com ele!
Os evangélicos luteranos são livres
libertados. Consequentemente, dispensam sacerdotes. Eles mesmos são sacerdotes
com quem Deus fala e através dos quais ele atua junto à Igreja e à Sociedade.
Nós encaramos as tarefas na Igreja e a política na Sociedade como alegre
serviço a Deus prestado para com homens e mulheres.
Os evangélicos luteranos são livres
libertados, participantes e semeadores da vida plena. Consequentemente,
promovem a medicina popular e apoiam os agentes de saúde. Ajudamos a organizar
movimentos populares que lutam por saneamento básico e assistência médica e
hospitalar para todos, em todos os recantos do País. Mesmo assim, a saúde não é
o nosso deus, nem a doença nos separa de Deus, cujo rosto brilha em Jesus
Cristo.
Os evangélicos luteranos, os livres
libertados, são da Igreja de Pedro e Paulo, dos primeiros livres libertados (p.
ex. At 2.14-47; 5.17-42; 10 - 11.18 e Gl 2.11-21; 4 - 5). Consequentemente,
militam para que a Igreja de Pedro e Paulo emerja, se articule e se mova, aqui
e hoje. Para nós, tal militância é a mais honrosa. É o bom combate pela Igreja
certa. Igreja certa é a Igreja que segue a Jesus Cristo, briga e sofre por
causa dele. Ë a Igreja que nada quer para si própria, mas tudo para Jesus
Cristo ( 1 Co 2.2; Gl 6.14; Fp 3.3-14) e os seus mais pequeninos irmãos (Mt
25.31-46).
Os evangélicos luteranos são livres
libertados.
Consequentemente, não gastam
forças, tempo e dinheiro com a estruturação eclesiástica. Nós nos batemos para
que todos "vasos" eclesiásticos, a começar pela IECLB, estejam a
serviço exclusivo do Reino de Deus. Esperamos e apressamos de toda maneira a
vinda do novo céu e da nova terra, onde reina a justiça (2 Pe 3.12s.). Agimos
na firme certeza da intervenção direta e definitiva, iminente de Deus (Ap 21):
enxugamos logo as lágrimas; consolamos já os entristecidos; compartilhamos
agora as dores; aliviamos de pronto os sobrecarregados; resistimos hoje à morte
e aos seus capangas; derribamos imediatamente os muros entre as pessoas e
acabamos com as classes de qualquer ordem. Sempre, no entanto, apontamos para o
próprio Deus, que vai morar em breve com os seres humanos, vai ser tudo para
eles, e eles serão o seu povo (vv. 3,22ss.).
Eis os evangélicos luteranos e as
evangélicas luteranas de todos os tempos e lugares! Assim é o seu jeito.